My pleasure é uma atenção, é um agradecimento:
– Foi com prazer, faça o favor de entrar. Neste trabalho não há nada de novo. Há uma enorme transformação. Acredito que siga a par do natural amadurecimento, uma vontade de aclarar. Trata-se de um trabalho de pintura em grandes dimensões, quase toda óleo sobre tela de linho. São telas com cerca de três metros de altura por dois metros de largo. São, agora, céus verticais com um pouco de terra no fundo, são como se fossem só fundos, sem ninguém, sem um olho, um olhar, nem de bicho, nem de pessoa. São talvez reflexo do meu quotidiano. O resultado do que vejo da minha janela no Alentejo onde vivo e trabalho. Parte de uma referência à pintura de Fragonard “Les hasards heureux de l’escarpolette”, onde é evidente a cena dramatúrgica, teatral, que desmonto até a transformar num lugar sem princípio, meio e fim, sem ponto de vista, onde a obra pode ser vista de lado, de cima, de baixo. Continuando com a mesma paleta, as pinturas vão-se transformando. Começam como imagino que comecem as pinturas abstractas: por uma ponta. Vou desenrolando a tinta como se fosse um rolo de alcatifa, o corpo vai andando desenrolando. Depois, descubro coisas que reconheço, umas vezes vou lá e dou a ver. Outras não, deixo estar assim. Este é um trabalho onde reconheço a mesma fisicalidade de sempre, o gesto bruto e livre, mas onde junto a liberdade de não responder a nada. É um trabalho sem obrigações figurativas. Neste processo de fazer, vislumbro a infinitude. Para mim um mundo novo. Este trabalho não é sobre nada. Este trabalho é o retrato do privilégio de poder fazer em liberdade. É um trabalho quase abstrato. É a constatação de uma possibilidade, a de fazer sempre, para sempre. É a enorme ambição de encher o vazio de silêncio. Lembro a sensação contraditória de liberdade que senti enquanto me transportava diariamente na estrada entre Birzeit e Ramallah nos Ford Amarelos, os “mini buses”, na Cisjordânia ocupada e eu livre a apanhar vento com o meu passaporte europeu no bolso. E agora neste trabalho, eu aqui, livre a pintar o céu. É a contradição entre a liberdade e a asfixia, a minha liberdade e o colapso da humanidade. Este trabalho, ao ser mostrado, como todos os meus trabalhos do passado, não está acabado, nem quero que esteja. Não procuro certezas nenhumas e muito menos coisas acabadas. Quero o impossível, coisas sem fim. Joana Villaverde Avis, Fevereiro 2024 |
My pleasure is an expression of attention, of gratitude:
– Thank you, please come on in. There is nothing new in this work. There is a huge transformation. I believe it goes hand in hand with a natural maturing, a desire for clarification. This is a large-scale painting, almost entirely oil on linen canvas. The canvases are around three metres high by two metres wide. They are now vertical skies with a bit of land at the bottom, as if they were just backgrounds, with no one, neither an eye nor a gaze, animal or human. Perhaps they are a reflection of my daily life. The result of what I see from my window in the Alentejo, where I live and work. It started from a reference to Fragonard’s painting “Les hasards heureux de l’escarpolette” [The Swing], where the dramaturgical, theatrical scene is evident, which I dismantle until it is transformed into a place without beginning, middle or end, without a point of view, where the work can be seen from the side, from above, from below. Continuing with the same palette, the paintings are transformed. They begin as I imagine abstract paintings do: at a single point. I unroll the paint as if it were a rolled carpet, the body slowly unfurling. Then I discover things I recognise. Sometimes I go in for a closer look and intervene; at other times I leave them as they are. In this work I recognise the same physicality as always, the raw and free gesture, but with the addition of the freedom to not respond to anything. It is a work without figurative obligations. In this process of making, I glimpse infinity. A new world for me. This work is about nothing. This work is a portrait of the privilege of being able to create in freedom. It is almost abstract. It is the realisation of a possibility, always creating, forever, and it is the enormous ambition of filling the void with silence. I remember the contradictory feeling of freedom as I travelled daily on the road between Birzeit and Ramallah in the yellow Ford the mini buses in the occupied West Bank, where I was there free, catching the wind with my European passport in my pocket. And now in this work I’m here, free, painting the sky. It is the contradiction between freedom and suffocation, my freedom and the collapse of humanity. This work, like all my past work, is not finished, nor do I want it to be. I’m not looking for any certainties, much less finished things. I want the impossible, things without end. Joana Villaverde Avis, February 2024 |